Paisagem com mulher e mar ao fundo
Quando entrou no comboio, a mulher pensou como era feliz. Tinha vivido duarante horas um pouco da vida verdadeira e isso não era pouco, era muito, se calhar era mesmo tudo. Olhou para trás e viu os carris ainda paralelos, mas logo a seguir olhou para mais longe e viu o ponto negro em que eles depois se confundiam. O coração apertou-se-lhe e encostou suavemente a cabeça ao vidro. O mar parecia calmo, apesar da cinza que caía do céu - cortinas e cortinas de água ligando o mar às nuvens. Um homem caminhava na praia como se o sol caísse a pique e mais adiante, num campo deserto de golfe, dois jogadores arrastavam os seus sacos debaixo de um imenso guarda-chuva. Entretanto começou a chover a sério e a mulher não viu mais nada. Reparou, no entanto, que do outro lado do vidro corriam rios como lágrimas aflitas - breves atalhos de água que o vento aos poucos convertia em pequenos lagos verticais. Quando chegou meteu-se no carro e foi para casa, com os olhos secos do futuro.
2 Comments:
profundo
Ontem olhei para o horizonte e não vi nem mulher nem mar. Hoje de novo essa ausência... Num mar de blogues e de mulheres banais, fazem muita falta os belíssimos textos da Isabel Cristina para ajudar a trilhar os caminhos do dia-a-dia.
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