Talvez de nós para os filmes que amamos
Normalmente, em relação aos filmes que muito amo, é apenas através de uma imagem em particular que os conservo para mim (porque só na intimidade de nós eles fazem o sentido final), por mais que eu racionalmente possa explicar o porquê do meu fascínio pelo filme como um todo. Lembro de repente uns quantos: Match Point, Habla con Ella, In the mood for love e Hannah and her sisters. E, de facto, é como se ao lembrá-los houvesse uma imagem a querer sobrepor-se a todas as outras possíveis - em Match Point é a imagem da aliança, suspensa por um segundo entre o rio e o jardim; no Habla con Ella é a soberba lide taurina da Elis Regina, quase em câmara lenta entre a vida e a morte de Lydia; no In the mood... é, como não, aquela magnífica dança das escadas entre o assombro dos vestidos dela e os (quase) silenciosos passos dele. Todavia, no Hannah and her sisters ocorrem-me duas imagens, que são afinal uma só: por um lado, é a imagem da Lee embrenhada na leitura do poema do e. e. cummings recomendada pelo cunhado, sentada e quieta na brancura da colcha como uma pequena ilha humana; por outro, é ainda a imagem, simultaneamente densa e subtil, que vai saindo de dentro do poema directamente para nós. Porque essa é uma imagem também, e fortíssima, que cito mais ou menos de memória:
Your slightest look easily will unclose me
though i have closed myself as fingers,
you open always petal by petal myself as Spring opens
(touching skilfully, misteriously) her first rose
i do not know what it is about you that closes
and opens; only something in me understands
the voice of your eyes is deeper than all roses
nobody, not even the rain has such small hands
Talvez as imagens que se fazem, para nós, maiores que as outras sejam aquelas que lentamente resvalam de nós para o filme e não do filme para a nossa surpresa ao vê-las. A pensar melhor.
2 Comments:
Não é preciso pensar melhor, Isabel Cristina. É exactamente isso. Científico. De tal modo que guardo, deste filme que também muito amo, exactamente a mesma imagem, a mesma exacta memória. E os livros do e.e. cummings, que só verdadeiramente comecei a ler ( e a amar) por causa do Michael Caine.
Belo blogue. Parabéns.
Como diz a Inês: belo blogue!
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